quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

24. Desenvolvimento da Estrutura da Igreja.

24. Desenvolvimento da Estrutura da Igreja.




Traduzido pelo Presbítero Pedro Anacleto



1. O paganismo e com ele o Império romano, basicamente pagão, não desapareceram sem haver deixado em sua maior parte à Igreja, a potência do futuro, todo o valioso que possuíam. O mesmo que os grandes e pequenos escritores eclesiásticos se haviam nutrido abundantemente da riqueza espiritual do paganismo (conhecimentos filosóficos e literatura), assim também passaram à Igreja as formas constitucionais do império. Esta foi o último grande gesto do decadente império universal. Não pecamos com exagero ao ponderar sua decisiva influência sobre a nova união política e político-eclesiástica que haveria de conseguir mais tarde como pressuposto básico do futuro Ocidente pela desagregação da antiga unidade.

A Igreja desenvolveu sua estrutura fundamental instituída por Cristo seguindo a constituição do império nos seguintes elementos e formas:

a) As comunidades cristãs ao princípio foram exclusivamente comunidades urbanas, sob um só bispo (§ 18). Desta maneira a zona urbana (civitas), ou bem a paróquia urbana (paróquia), era o que mais tarde se chamou diocese ou sede episcopal; as zonas circunvizinhas, que geralmente eram evangelizadas desde a cidade, estavam naturalmente sujeitas à sua vigilância espiritual. Para este fim, acabadas as perseguições, se designaram bispos rurais 11, em cujo lugar atuaram depois sacerdotes por encargo do bispo. No Oriente, desde muito cedo, algumas igrejas urbanas foram confiadas aos presbíteros. Quanto mais se difundia a mensagem cristã e quanto maior e mais variada era a atividade dos sacerdotes no campo, tanto mais independentes se fizeram ambos: as paróquias rurais e os párocos. O estabelecimento de paróquias rurais teve lugar no Ocidente até os séculos V-VI. Por subdivisão destes distritos se multiplicaram as paróquias, ao mesmo tempo que o presbítero que ao princípio estava à frente da única paróquia (arcipreste) ganhava uma certa autoridade. Nas cidades, até o século XI, a liturgia eucarística a celebrava só o bispo, acompanhado dos presbíteros.

b) Os eclesiásticos eran ordenados para una iglesia determinada y en ella debían permanecer. Generalmente, también era el sacerdote de esta iglesia quien les formaba.

A partir do século V eram admitidos ao estado clerical somente os livres. (Prescindimos aqui da evolução medieval). Pelo contrário, nos primeiros séculos também eram diáconos e presbíteros os escravos e os livres; o Papa Calixto I (217-222) havia sido escravo. Leão I proibiu expressamente que um escravo fosse nomeado bispo. Como motivo argumentou que o que tem de obrigar-se ao serviço divino deve estar livre de outras obrigações. Esta mudança de atitude veio condicionada pela incorporação da Igreja à sociedade e ao Estado, mas não foi, nem muito menos, uma amostra de aprofundamento e realização do espírito evangélico.

Os eclesiásticos viviam de trabalho de suas mãos (artesanato e agricultura; o comércio estava a princípio autorizado, mas logo foi proibido), mas todos participavam dos bens eclesiásticos, que cresciam rapidamente. A isto se tem de referir ao dizimo.

c) A província eclesiástica correspondia à província estatal com seu governador como cabeça. O bispo da capital (metrópole) se converteu em metropolita, e a ele correspondia um certo direito de vigilância sobre os bispos da província. Convocava os sínodos provinciais em sua cidade e os presidia. O Concílio de Nicéia, por exemplo, ditou normas sobre as atribuições do metropolita.

d) Finalmente, também na Igreja oriental se chegou a uma ampla uniformidade. A imitação das dioceses do império com seu governador imperial à frente, se criaram ali exarcados ou patriarcados. Eram igrejas cuja tradicional influência se estendia desde a antiguidade além da província (o mesmo que o poder jurídico das respectivas cidades também dominava políticamente os territórios limítrofes): Antioquia e Alexandria. A estas se uniu mais tarde Constantinopla e no ano 451, durante o Concílio de Calcedônia, Jerusalém. No Ocidente não existiu esta divisão: o papa era considerado o patriarca do Ocidente. Ao qual foi muito importante para a unidade da Igreja ocidental.

2. O bispo dirigia a vida inteira da comunidade. Nas cidades havia desde muito tempo uma domus ecclesiae: casa de Deus, casa da comunidade, casa do bispo. Todavia no século IV não encontramos nas cidades mais que uma só igreja, a do bispo. O bispo era também a alma da atividade caritativa. Já no século IV exercia sobre os eclesiásticos uma jurisdição reconhecida pelo Estado. O mesmo imperador Justiniano, quando se tratava de uma querela contra um eclesiástico, remitia inclusive os seculares ao ditame do juiz eclesiástico. No turbulento período das primeiras migrações, em todas as partes eram os bispos os pontais da resistência contra os barbari invasores (§ 33) e depois, com a vitória destes, os defensores da população local frente aos novos senhores.

O bispo não devia ser chamado diretamente do estado secular, senão que tinha que recorrer à escala dos distintos ministérios. Sua eleição a efetuava o povo e os bispos da província, ainda que no Oriente a influência da comunidade na eleição decresceu rapidamente.

Em religião, moral, política e economia: em todos os âmbitos da vida pública cresce a influência do clero. Graças a sua elevada formação e à sua influência sobre o povo, os bispos assumem em seguida outros afazeres superiores, antes desempenhados por funcionários políticos. O clero faz sua entrada na esfera política. Desde um posto de servidor da política pouco a pouco se eleva, no Ocidente, até a uma certa independência frente ao Estado. Anuncia-se já a posição do clero na Idade Média. A postura de Santo Ambrósio, que apoiado unicamente em seu poder espiritual pode atrever-se a proibir a um imperador romano (Teodósios) à entrada em sua igreja e a impor-lhe uma humilhante penitência, mostra a enorme diferença que por efeito da potencia espiritual da sacralidade cristã, media entre as duas épocas, a cristã e a pagã.

E, por fim, no ano 494, nos encontramos com um pensamento absolutamente inimaginável para o homem antigo. O Papa Gelásio I, em uma carta dirigida ao imperador Anastásios, declara que o poder espiritual é completamente independente do poder temporal.

Isto, por suposto, era só um programa que por muitos séculos nem sequer no Ocidente chegou a realizar-se (entre outras coisas porque, de um modo ou de outro, seguiu vigente o sacerdócio real do soberano temporal).

3. A necessidade de regular unitariamente as questões de disputas doutrinais, disciplinares e culturais, assim como a de proteger, reforçar ou restabelecer, por desejo e interesse do imperador, a unidade da Igreja (base da unidade política), deu origem à convocação de sínodos imperiais gerais.

a) À estas assembléias eram chamados os bispos de toda a ecumene, ou seja, de todo o mundo então conhecido (daqui o nome de "concílios ecumênicos"). A convocatória a fazia o imperador, que também exercia um poder decisivo em seu desenvolvimento. Os órgãos estatais cuidavam da segurança exterior e da ordem. O Estado dava facilidades para as viagens e a estada. Os oito primeiros sínodos imperiais 12 se celebraram no Oriente, precisamente —ao qual é muito importante— nas proximidades da residência imperial. Em nenhum deles participou um papa diretamente; de ordinário se fazia estar representado por seus delegados. No Concílio de Constantinopla, convocado por Teodósios no ano 381 (um ano depois da aniquilação oficial do arianismo), só estiveram presentes os bispos orientais, sem nenhuma representação do papa.

Para compreender ao todo a função dos concílios na história da Igreja temos que ter presente que neles, substancialmente, se tratava de problemas dogmáticos e de sua formulação teológica, como já temos indicado, mas também que seu ambiente em nenhum caso estava exclusivamente, nem sequer principalmente, orientado ao acadêmico-teológico. As discussões tinham um forte selo político e político-eclesiástico; se desenvolveram (sobretudo a partir do século V) com toda vivacidade e colorido entre os partidos e inclusive as facções, que se agrupavam uns em torno ao patriarca de Alexandria, outros em torno do bispo de Jerusalém e outros em torno do patriarca de Antioquia ou de Constantinopla. Em Éfeso, por exemplo, no ano 431, são as discussões entre os partidários de São Cirilo de Alexandria e os partidários de Nestório de Constantinopla, respaldados pelos representantes da corte imperial, aos quais deram forte relevo ao quadro. Em tais discussões Antioquia era a porta-voz do Oriente e Alexandria do Ocidente. Necessário é recalcar o entranhado político e político-eclesiástico daquelas discussões pelas enormes conseqüências que daí se seguiram para a história da Igreja e especialmente pela separação que elas mesmas contribuíram para provocar entre a Igreja oriental e ocidental. O fato de por isto em relevo, sem embargo, não devemos infra valorizar a importância teológico-dogmática destes concílios, que nunca será ponderada o suficiente.

b) A importância especial corresponde ao primeiro Concílio de Nicéia (325), convocado por Constantino. Graças a sua decisão com respeito à relação da divindade do Pai e do Filho (§ 26) se salvou a tradição revelada. A divindade do Filho, isto é, do Redentor, foi definida como doutrina obrigatória, com o que caiu afiançada para sempre a base da teologia da redenção. Especialmente com o emprego do termo homoousios (consubstancial), a cultura grega resultou ser um magnífico sustentáculo da Fé cristã.

Isto vale sem limitação alguma para o Ocidente, donde a palavra se traduziu por consubstantialis; em troca, no Oriente muitos que confessavam a plena divindade do Filho rejeitaram precisamente este termo não bíblico 13, desde há muito tempo discutido, pois juntavam nela certa concepção modalista (§ 16) na linha das várias vezes condenada doutrina de Paulo de Samosata e de Sibélio (por volta de 260). O mesmo Atanásios mostrou a princípio, certa reserva a respeito a esta expressão. O sucesso é altamente significativo, porque nos põe de manifesto a relação, importantíssima para a unidade da Igreja como, ao contrário, para as possíveis separações, que existem entre doutrina e fórmula doutrinal, entre doutrina e linguagem. Em quase todas as controvérsias doutrinais de tempos posteriores, como também em toda tentativa de superar os cismas eclesiais e até no atual movimento Una-Sancta, este problema desempenha um papel extraordinariamente importante. Uma e outra vez se pode comprovar que umas mesmas expressões queriam dizer coisas diferentes; mas também que alguns, com diferentes fórmulas, queriam expressar o mesmo que seus adversários (cf. § 29).

4. O patriarca do Ocidente, bispo de Roma, cabeça da única Igreja apostólica do Ocidente, não tinha nenhum rival que com parecida autoridade houvera podido reivindicar sua independência na linha de uma fundação apostólica, como, por exemplo, Antioquia no Oriente. Por isso pode, quase sem obstáculos, consolidar sua posição como sucessor de São Pedro, a pedra fundamental da Igreja designada por Jesus. Porém, também Roma teve oponentes eventuais em Cartago (século III), Árles, Milão (século VI; veja § 27) e São Denis (século IX); cf. também Aquiléia (com o título de patriarcado).

Os bispos romanos se mostraram como verdadeiros vigilantes da ortodoxia nestes tempos de controvérsias sobre a Fé. (As disputas doutrinais dos três primeiros séculos se decidiram quase todas em Roma, por exemplo, a readmissão dos fornicadores e os lapsi, e outro tanto a controvérsia do batismo dos hereges. Outras decisões devem a Roma sua confirmação definitiva, por exemplo, a fixação do cânon das Sagradas Escrituras). A prioridade romana foi solenemente reconhecida pela primeira vez no Sínodo de Sárdica (343), ao atribuir ao bispo de Roma (invocando a fundação da Igreja de Roma por Pedro) a faculdade de comprovar qualquer deposição de um bispo decretada por um sínodo e, dado o caso, rechaçá-la.

Inclusive hereges (como Nestório e Eutiques) reconheceram indirectamente a importância e a autoridade do bispo de Roma, ao procurar que em Roma sobre tudo fossem atendidas suas opiniões. Também os Sínodos de Constantinopla e de Calcedônia confirmaram (no sentido já assinalado) a alta posição dos bispos de Roma. A duração dos pontificados nestes tempos era geralmente curta, seu número grande e sua importância individual escassa. Muitos foram os papas que se ocuparam das controvérsias contra os hereges (arianismo, nestorianismo, monofisismo).

Nesta época não existia todavia uma entitulação especial para o papa. Toda uma série de qualificativos, que mais tarde só se aplicariam ao papa, se aplicavam então também aos demais bispos. Contudo, apartir do século VI a expressão "papa" começou a reservar-se em exclusividade para o bispo de Roma. Mas a pouca transcendência que este título comportava respeito à autoconciência dos grandes papas deixavam claramente demonstrada com o exemplo do humilde Gregório I. Evidentemente há um contraste abismal, ao menos no plano teórico-abstracto, entre esta postura e a alta consciência que de si mesmo tivera Gregório VII e muitos de seus sucessores.

O grande oponente do papa era o imperador romano. Quanto mais interessado se encontrava o patriarca de Constantinopla pelo poder do imperador, tanto mais facilmente o poder deste bispo, aumentado estava pelo efeito das decisões dos Concílios de Constantinopla e de Calcedônia, comportava um incremento do poder eclesiástico do imperador. Surgiu então o perigo de que toda a Igreja caísse em mãos do Estado. Frente a tudo isto, o primado do bispo de Roma significava, em última instância, nada menos que a salvação da liberdade da Igreja. Sem Roma, é considerado desde o ponto de vista histórico, não se teria dado ao longo um governo espiritual autônomo da Igreja.

5. Neste tempo a figura mais significativa na cátedra de São Pedro foi Leão I, o Grande (440-461). Viveu em meio a violentas lutas externas e internas (queda do Império, invasão dos bárbaros, monofisismo). Sua figura sobrevive na história pela sublime cena de Mântua (452), donde Leão, só enquanto chefe espiritual e eclesiástico, desarmado, conseguiu a retirada do feroz Átila: impressionante demonstração de sua eminente grandeza e do poder espiritual por ele representado 14. Era um autêntico romano, representante do império, e um verdadeiro papa; consciente da missão de Roma e do primado romano e, por conseqüência, totalmente preocupado em exercer realmente a direção da Igreja universal. No Concílio de Calcedônia (451), entre um sem número de intrigas pela parte contrária, logrou por um fim com uma de suas célebres cartas dogmáticas (ao patriarca Flavianos de Constantinopla) a condenação do patriarca de Alexandria e a recusa de sua doutrina monofisita.

Embora sua vitoriosa luta contra a tentativa de Hilário de Árles (+ 449) de criar um governo eclesiástico independente de Roma, Valentiniano III, com seu edito do ano 445, confirmou o primado da sé de São Pedro sobre todo o Ocidente. Nenhum outro bispo de Roma antes dele havia sido tão consciente deste poder espiritual universal. Mas esta consciência de poder esteve equilibrada na síntese católica em conformidade com 1 Pedro 5:2 "Sem diminuir a autoridade dos superiores nem reduzir a liberdade dos inferiores."

De Leão I provém, as mencionadas cartas, tão importantes para a história eclesiástica e dogmática, uma série de vibrantes homilias de corte clássico.

O Papa Gregório Magno (590-604), que ainda poderia agregar-se a esta época, pertence mais bem à seguinte. É o primeiro papa da Idade Média.

6. Dando uma olhada retrospectiva, podemos claramente constatar que a consciência dos bispos romanos sobre sua posição primacial, cresce com o exercício. Mas sua evolução não dependeu nem própria nem exclusivamente da possibilidade concreta de impor victoriosamente a idéia da supremacia papal sobre os demais bispos. A idéia defendida por Johannes Haller, segundo a qual o papado se entende como uma pura categoria política, passa por alto os dados comprováveis do Novo Testamento e seu correspondente conteúdo religioso com respeito à idéia e verificação do primado papal. Certos supostos essenciais da evolução da família eclesiástica romana são para seus membros, por tradição viva e ininterrupta, evidentes. O estranho que pretenda emitir juízo sobre esta família deve esforçar-se por penetrar no modo como se entendem essas evidências e não duvidá-las na análise.

11 Pelo termo que significa "região," foram chamados "corepíscopos" (bispos rurais). A instituição se manteve no Ocidente, nos territórios germânicos, por necessidades da evangelização, até o século X, e alguns resíduos até os séculos XI e XII.

12 São os sete concílios ecumênicos e o chamado "Sínodo dos ladrões" (429) (cf. § 27).

13 Os gnósticos e Paulo de Samosata, de idéias monarquianas, já o haviam empregado. Em um sínodo celebrado contra este último no ano 268, esta expressão foi inclusive condenada directamente. (Paulo de Samosata, desde o ano 260 aproximadamente, era bispo de Antioquia e governador da rainha de Palmira; Antioquia foi conquistada no ano 272 pelo imperador Aureliano).

14 Um encontro parecido de Leão com Genserico, rei dos vândalos, teve lugar no ano 455; o papa pode livrar a Roma do incêndio e dos assassinatos, mas teve que permitir um saque dentro de um palácio limitado.



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Sacerdote ortodoxo e busco interessados na Santa Fé, sem comprometimentos com as heresias colocadas por aqueles que não a compreendem perfeitamente ou o fazem com má intenção. Sou um sacerdote membro da Genuina Igreja Ortodoxa da Grecia, buscamos guardar a Santa Tradição e os Santos Canones inclusive dos Santos Concílios que anatematizam a mudança de calendário e aqueles que os seguem, como o Concílio de Nicéia que define o Menaion e o Pascalion e os Concílios Pan Ortodoxos de 1583, 1587, 1593 e 1848. Conheça a Santa Igreja neste humilde blog, mas rico no conteúdo do Magistério da Santa Igreja. "bem-aventurado sois quando vos insultarem e perseguirem e mentindo disserem todo gênero de calúnias contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos pois será grande a vossa recompensa no Reino dos Céus." "Pregue a Verdade quer agrade quer desagrade. Se busca agradar a Deus és servo de Deus, mas se buscas agradar aos homens és servo dos homens." S. Paulo. padrepedroelucia@gmail.com